terça-feira, 27 de julho de 2010

S de saudades, de Saramago

"(...)
E tu para que queres um barco, pode-se saber, foi o que de facto o rei perguntou...
Para ir à procura da ilha desconhecida, respondeu o homem.
Que ilha desconhecida, perguntou o rei disfarçando o riso, como se tivesse na sua frente um louco varrido, dos que têm a mania das navegações, a quem não seria bom contrariar logo de cara.
A ilha desconhecida, repetiu o homem.
Disparate, já não há ilhas desconhecidas.
Quem foi que te disse, rei, que já não há ilhas desconhecidas.
Estão todas nos mapas.
Nos mapas só estão as ilhas conhecidas.
E que ilha desconhecida é essa de que queres ir à procura. Se eu to pudesse dizer, então não seria desconhecida.
A quem ouviste tu falar dela, perguntou o rei, agora mais sério.
A ninguém.
Nesse caso, por que teimas em dizer que ela existe.
Simplesmente porque é impossível que não exista uma ilha desconhecida.
E vieste aqui para me pedires um barco.
Sim, vim aqui para pedir-te um barco.
E tu quem és, para que eu to dê.
E tu quem és, para que não mo dês. (...)"

José Saramago
O conto da ilha desconhecida.
São Paulo: Companhia das Letras. 1998

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